domingo, 13 de setembro de 2009

UMA QUESTÃO DE ESCOLHA /DANUZA LEÃO

Até os 30, eram amigas inseparáveis. Saíam, viajavam e aprontavam sempre juntas. Até que uma delas se apaixonou por um estrangeiro meio aventureiro e sumiu no mundo com ele. A outra ficou com uma certa inveja, mas sabendo, bem dentro dela, que não teria coragem para fazer a mesma coisa. Continuou sua vida, casou com um homem que lhe dava paz e nunca mais teve notícias da amiga tão querida.
Vinte anos se passaram e, um dia, as duas se cruzaram num restaurante. Foi um encontro mágico e já deixaram marcado um almoço para aquela semana. Ambas chegaram 15 minutos antes da hora, tal a vontade de se reverem e de botar as notícias em dia. A que havia ganho o mundo contou que a grande paixão tinha duradopouco mais de um ano, mas, como estava em Paris, cidade que adorava, procurou um trabalho, mesmo modesto, com salário apertado, para poder ficar. Foi pulando de paixão em paixão, nas férias viajava de trem para outros países – viagens econômicas – e assim conheceu grande parte da Europa. Houve muitas noites em claro esperando que ele – o homem da hora – chegasse e muito choro de madrugada, sozinha, porque ele não apareceu. Mas houve também verões maravilhosos na Grécia, noites inesquecíveis em Veneza e momentos de intensa felicidade. Mas um dia ela acordou e se perguntou: “O que é que estou fazendo aqui?”. Resolveu voltar. E ali estava, aos 50 anos, sem trabalho, sem filhos, sem ter um homem para chamar de meu amor, tendo que começar tudo de novo e sem se entender muito bem. E quis, logo, saber da história da amiga.
A outra havia se casado, tinha dois filhos já grandes e uma vida confortável, tranqüila, sem muitas novidades. Mas era feliz, e isso é o que importava.
Não tinha do que se queixar: o marido é um bom pai, não reclama de nada, chega sempre na hora e todo ano, no dia do aniversário de casamento, data que ele nunca esquece, vão jantar fora – e da última vez terminaram a noite num motel. Mas algumas bobagens a irritam. Quando, por exemplo, nos fins de semana, ele veste invariavelmente uma bermuda, camiseta, põe nos pés aquela sandália e fica vendo futebol na televisão. Nesses longos anos de casamento nunca se sentiu atraída por outro homem, a não ser em pensamento claro. Mas nunca o traiu, pois sente nele uma firmeza reconfortante. Toda vez que ele volta de uma viagem e ela vai esperá-lo no aeroporto, seu coração bate mais forte e pensa, na porta do desembarque: “E se ele não chegar?”, só que ele sempre chega. O bem maior desse casamento, segundo ela, é que entre os dois existe um grande respeito.
Embalada pelo segundo copo de vinho, a casada se abre e diz que o marido não precisava ser tão previsível. Ah, como gostaria que um dia ele aparecesse com um brilho diferente nos olhos – fosse de desejo, admiração ou ódio – um brilho que significasse alguma vibração. É disso que ela sente falta; só disso, de mais nada.
A solteira, que passou todos esses anos só com "esse isso”, pensa que gostaria de ter uma casa, um marido, uma certa paz. Será que foi louca e jogou a vida fora? Já a outra fica pensando que está há 20 anos com o mesmo homem, não conheceu nada do mundo e acha que talvez devesse ter tido mais coragem de se aventurar antes de entrar num casamento tão sólido. Será que foi louca e jogou a vida fora?
Elas se despedem e cada uma vai para o seu lado, sem saber afinal, o que pensar da vida.

Danuza Leão é cronista, autora de vários livros, entre os quais Na Sala com Danuza 2 (ARX) e Quase Tudo (Cia. das Letra .

7 comentários:

Aninha disse...

é engraçado como SEMPRE podemos escolher entre vivenciar uma ou outra vida, né? mas escolhemos uma delas e aí começamos a pensar nos "e se..."
muito bom o texto! e chego à conclusão de que nunca estaremos plenamente satisfeitos com a nossa escolha, seja ela qual for.

beijos e bom domingo!!!!!!

Bacouca disse...

Lisa,
Adorei seu texto e devo dizer que as duas personagens se incorporam em mim:gozei muito, namorei muito, aventurei-me muito, mas felizmente quando chegou a altura de assentar, pelo ritmo natural da vida, escolhi o que tem sido o meu melhor amigo, amante e marido!
Um beijinho

Mônica disse...

Eu li este texto de Danusa. Não lembro em qual revista.
E fiquei pensando. Tem tanta gente que quer o lugar do outro sem saber realmente como é a vida da outra pessoa.
Eu não troco a minha nem por um par de sapato alto do meu numero.
Que a coisa mais dificil de achar por ser meu numero 31.
Com carinho Monica
Hoje fomos passear em santa Luzia. Uma cidadezinha gostosa!

Anônimo disse...

Já ouvi muito dizerem que a comida do vizinho é mais gostosa. Nos temos esse habito de sempre nos suspiros de nossas imaginações a indagação " E se tivesse sido assim ?" Eu gosto sempre de pensar que sou o que vivi ate agora e, por gostar tanto do que me tornei, fico feliz pelo caminho que segui ate aqui.
Um abraço :) !!!!

Elisa no blog disse...

Acho que sou uma pessoa de sorte.
Sou casada mas continuo viajando e conhecendo lugares, pessoas e comidas diferentes. Talvez por isso eu não tenha inveja de ninguém. Só de mim mesma. rsrs
Um dia vai chegar o seu dia. É só sonhar e acreditar.
bj

Aninha disse...

Oi Lisa,
obrigada pela dica!!
eu entrei lá e achei muito legal a grade curricular do curso!
O único grande problema é a localização, mas vou ver se consigo escapar da empresa mais cedo.
Quando eu concretizar a matrícula, eu aviso!!
muito thanksssss

beijosss

Mônica disse...

Eu queria ter te telefonado ontem ,mas fomnos passear por Santa Luzia e chegamos cansadas.

Como sou a primeira neta e primeira bisneta, meus avós são tudo de mais sagrado.
Mas Na história da vida existe o outro lado de uma história. um dia te conto!
Com carinho Monica