domingo, 4 de julho de 2010

Propaganda enganosa

Passo dias olhando para o espelho, pensando: tenho que cortar meu cabelo. Não dá mais, não dá mais. Aí marco hora no salão do Hugo e, quando chega o dia, shazam: acordo com um cabelo de comercial de xampu. Tem sido assim desde que me conheço por gente: planejo tosá-lo (repica, Renê, repica!) e, no dia da chacina, ele amanhece sedoso, exuberante, e eu, que estava cheia de coragem, só aparo as pontinhas.

Situações inversas são ainda mais comuns. Você adora as roupas de uma loja, é cliente prefencial, faz sua visita a cada mudança de estação e nunca volta pra casa de mãos vazias, até que um dia resolve levar junto com você uma amiga que nunca esteve nesse antro de perdição, e chegando lá, não há um trapo que preste nas araras. Tudo sem graça, sem estilo, não é um azar que logo hoje a coleção estivesse tão desbotada?

Você fala maravilhas da sua cozinheira, guarda a moça a sete chaves como se fosse um bilhete premiado, não há quem faça um risoto melhor do que o dela, não há, nem em Milão, nem em Paris, e você vai demonstrar, convida um casal de amigos pra jantar na sua casa, eles chegam desconfiados e óbvio – óbvio, criatura! – que o risoto não vai sair do jeito que você anunciou, será mais um risoto entre todos os risotos, por que você não aprende?

Sua irmã retorna da praia uruguaia da qual você fez propaganda e, entortando o nariz, diz que não achou nada de mais. Sujeitinha implicante. No feriado seguinte você retorna ao local e não é que o paraíso perdeu mesmo o charme?

Você está nas alturas: “Gurias, estou saindo com um deus! Dá de goleada no Kaká e no Julio Cesar juntos. Vocês verão, ele está chegando aí, se comportem”. E o deus chega sem provocar suspiros em ninguém, e então você observa melhor e pensa: ele tinha que ter colocado essa camisa fúcsia e deixado esse bigodinho logo hoje?

E assim será com o sensacional médico que você recomendou e que irá perfurar o útero da sua prima numa cirurgia. Com o show de um grupo de jazz imperdível que colocará sua turma pra dormir. Com o hotel baratinho e limpíssimo em Nova York que você indicou pra sua cunhada, onde ela pegará sarna.

Tem jeito. Quando seus amigos perguntarem como é sua nova namorada, que é sósia da Alessandra Ambrosio, diga: “Dá pro gasto”. Quando voltar de Fernando de Noronha, comente: “Um lugarzinho simpático”. Quando levar amigos pra comer no restaurante do Claude Troisgros, faça muxoxo: “O peixe até que é razoável”. E não se fala mais nisso.

(Martha Medeiros)

Um comentário:

Mônica disse...

Lisa
Martha Medeiros tem um jeito especial para escrever sobre gente comum.
Voce já leu o livro de Padre Fabio de Melo?
Mulheres de aço e de flores?
Eu não sei como ele conseguiu escrever como se fosse mulher.
Tem frases que é como se ele estivesse falando, mas outras será que contaram pra ele?
Se não, ele é um grande inventor de ideias.
com carinho mOnica